terça-feira, 9 de junho de 2009

Lições de uma derrota


QUANDO QUEREMOS PARECER-NOS de tal modo com os nossos adversários políticos que nos confundimos com eles, é certo e sabido que, mais cedo ou mais tarde, os eleitores que nos contemplam acabam por preferir os originais às imitações, ou, pura e simplesmente, repudiam os originais e as cópias, por indecente e má figura, optando pelos extremos.

A maioria dos partidos socialistas, social-democratas e trabalhistas europeus quis de tal forma identificar-se com a economia liberal de mercado e o turbocapitalismo financeiro, para se afastar das ruínas do comunismo soviético e repudiar os estigmas da extrema-esquerda, que, às tantas e sem dar por isso, já tinha ultrapassado pela direita muitos partidos conservadores, democratas-cristãos e liberais, embrenhando-se paulatinamente na selva de um mercado totalmente desregulado e completamente à deriva.

Esta é uma das boas explicações para se perceber o descrédito de muitos partidos social-democratas, socialistas e trabalhistas, que, ao contrário do que seria de esperar deles, não conseguiram emergir desta grande recessão, desta crise brutal do turbocapitalismo financeiro, como a alternativa mais óbvia e mais credível ao capitalismo ultraliberal defendido e praticado pelos partidos de direita nos últimos trinta anos.

Pior ainda: o «regresso do Estado» foi orquestrado, por razões meramente oportunistas, precisamente por aqueles partidos da direita ultraliberal que mais o torpedearam e que mais fragilizaram os seus alicerces, com a conivência imbecil da social-democracia europeia, cujo excesso de zelo a fez ignorar os mais fracos e mais desfavorecidos.

Será desta que os eleitores da esquerda democrática conseguirão correr de vez com os Blair, os Brown, os Zapateros e os Sócrates do nosso descontentamento, neste terrível inverno do socialismo democrático, outrora de rosto humano?! A resposta não é fácil, quando a social-democracia perde por falta de comparência e de convicções, deixando o terreno livre para a ascensão da demagogia, do populismo e do oportunismo de direita.

quinta-feira, 4 de junho de 2009

Vitorino estará a gozar com Durão?

NUMA ENTREVISTA à TSF e ao DN publicada domingo passado, o dr. António Vitorino, sempre certeiro e bem-humorado, qualificou o dr. Durão Barroso, actual presidente da Comissão Europeia, como «o nosso homem em Havana», ou «o nosso agente em Havana», numa claríssima alusão aos títulos (inglês e português) de um dos romances mais notáveis, divertidos e populares do grande escritor inglês Graham Greene.

Ora bem. Como esta comparação com o personagem principal do romance de Graham Greene é bastante desprimorosa para o dr. Durão Barroso, é caso para perguntar se o dr. António Vitorino, com o seu finíssimo sentido de humor, não estaria a ironizar, ou a gozar, ou mesmo a divertir-se à custa do actual presidente da Comissão Europeia?!

Porque, quem leu o romance de Graham Greene, sabe perfeitamente que o personagem recrutado pelos serviços secretos britânicos é um cidadão inglês obscuro e medíocre que vende aspiradores em Havana há vários anos. E é um homem fraco e vulnerável que se revela capaz de todo o tipo de condescendências, inclusive falsificações e mentiras, só para ganhar o dinheiro que lhe pagam os serviços secretos, que é muito.

Aliás, a mais célebre e divertida falsificação de Mister Wormold (assim se chama o vendedor de aspiradores recrutado como espião) consiste, precisamente, em desenhar o esboço de uma nova arma secreta a partir das peças de um aspirador que ele desmonta na sua loja de Lamparilla Street, em Havana.

Perante isto, a minha dúvida é a seguinte: será que o dr. António Vitorino leu mesmo o romance de Graham Greene, e quis gozar com o dr. Durão Barroso comparando-o com um personagem literário perfeitamente ridículo? Ou será que, tal como o Prof. Marcelo Rebelo de Sousa, o dr. António Vitorino também já se habituou a citar e a recomendar livros que nunca leu?

Esta é a minha dúvida. Veremos se o dr. António Vitorino a esclarece. Mas aproveitem para ler «Our man in Havana» («O nosso agente em Havana»), se ainda não o leram!